quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Ela dizia: "Acho lindo rosto negro com uma cicatriz bem profunda na face!"


Terceira Série, grupo escolar, 1965. A professora era amada por todos os alunos, considerada uma das melhores daquela escola. As crianças comentavam entre si sobre a expectativa de passar para sua classe.

Naquele tempo, é claro, não havia internet, não se seguia o “politicamente correto” (nem o termo era usado).  Crianças e adolescentes eram mais ingênuas e submissas.

A menina negra de trancinhas também ficou empolgada ao passar para a classe da professora “famosa”. De fato, ela era simpática e ensinava os conteúdos muito bem. Mas, com crianças negras, usava de ironia e sarcasmo que desafiavam a lógica e as deixavam confusas. Tais alunos não compreendiam certas “colocações” feitas, ficavam curiosos tentando entender o significado; às vezes, comentavam em casa, tentando obter ajuda dos pais para compreender o que fora dito na classe.

Exemplos de atitudes da professora:

·        Ela, por várias vezes, segurava a face de uma criança negra (tendo as bochechas entre seu polegar e indicador) e dizia: “Acho lindo rosto negro com uma cicatriz bem profunda na face! ” E riscava toda a face com o dedo (sempre sorrindo) mostrando como deveria ser a cicatriz. Fazia isso cada vez numa criança negra, em dias diferentes, passando por todas e repetindo em algumas. Uma vez, a menina de trancinhas  que tinha uma leve marca no rosto, causada por acidente em brincadeira    infantil, disse ingenuamente, tentando ser agradável e receber um elogio da professora querida: “Veja, eu já tenho uma cicatriz no rosto!” Ela respondeu sorrindo, sem perder o tom gentil da voz: “Essa é muito suave, para ficar  bonita precisa ser bem mais profunda!” (Mesmo com tanto cinismo, a menina não percebeu maldade, mas comentou em casa, muito encabulada com a ideia de que: para ficar bonita e ter a aprovação da professora “boazinha”; precisaria ter uma cicatriz profunda no rosto). A mãe ficou pensativa, mas não disse nada.

·        Também a professora dizia que o correto em português seria dizer lábios (se referindo a brancos) e beiço (quando se tratasse de negros).

·        De repente, do nada, ela abraçava uma criança negra e perguntava-lhe, sorrindo, como ela havia conseguido estar estudando naquela escola tão boa (era escola pública de bairro modesto). A criança explicava  com simplicidade que os pais a havia matriculado. Ela dizia que há pouco tempo atrás, escola era só para brancos e que negros faziam serviços muito simples e não precisavam perder tempo estudando.
Todo esse comportamento da “tal professora maravilhosa”, “passou batido”, ela nunca foi questionada, sempre foi tida como uma professora exemplar! Eis, talvez, uma das  principais razões de se dizer que no Brasil não haja racismo:  ELE NÃO É RECONHECIDO!                                                           

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